terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Sem Apelação

 


Pai de adolescente andava angustiado com o comportamento do filho de 15 anos. Desde que notou que o filho falava com uma voz muito fina passou a observá-lo mais, e percebeu que ele também usava de trejeitos com as mãos e fazia movimentos com a cabeça ao se comunicar com as pessoas nem um pouco convenientes para um garoto da sua idade. Desconfiado, intrigado, e sem saber como lidar com aquele problema o pai passou a discutir o assunto com vários amigos interessado em descobrir, a partir da provável experiência de algum deles, um meio seguro de esclarecer as dúvidas que vinham lhe tirando o sono há algum tempo. Ouviu várias sugestões: “Por que você não senta com seu filho e conversa abertamente sobre o assunto com ele?” Disse alguém.
- Tenho o sangue muito quente e ando nervoso demais ultimamente, ele respondeu. Tenho medo de interpretar mal uma resposta qualquer e acabar agredindo o meu filho fisicamente. Seria um erro imperdoável. Não quero agir apoiado apenas em minhas suposições. Se eu causar um trauma ou prejudicar a vida do meu garoto injustamente não vou me perdoar.
"Acho que a sua esposa seria a pessoa certa para conversar sobre esse assunto com o garoto e esclarecer as suas dúvidas", disse outro.
- Não creio que esta seja uma boa opção também. Minha esposa é muito lerda, sem iniciativa. E certamente que não vai me contar nada se por acaso descobrir alguma coisa.
Completamente perdido, totalmente inseguro e sem saber como agir aquele pai sofria sufocado com as suspeitas que o afligiam. Andava calado, desanimado, matutando sempre até que uma amiga lhe sugeriu que levasse o filho a um psicólogo.
- Mas é claro! Como não pensei nisso antes?!
No dia seguinte, ao entrar no escritório, a primeira coisa que ele fez, foi ligar para um psicólogo e marcar uma consulta. No dia marcado, ele mesmo se encarregou de levar o filho ao consultório. Depois de alguns minutos aguardando na sala de espera, ouviu chamarem pelo nome do filho. Não teve dúvidas, levantou-se, deixou o garoto sentado na recepção e entrou na sala do médico.
- Doutor, a consulta não é comigo, é para ser com o meu filho que eu deixei aguardando lá fora. Eu entrei primeiro porque faço questão de esclarecer o motivo de estarmos aqui hoje. Não é de agora que eu percebo que meu filho vem agindo de maneira muito estranha. O garoto fala fino demais pra idade dele, usa de muitos trejeitos com as mãos enquanto conversa, balança a cabeça... Enfim, estou desconfiado de que ele seja homossexual e não vou sossegar enquanto persistirem as minhas dúvidas. Não me sento pra conversar com ele porque ando muito estressado e sei que corro o risco de perder a paciência em algum momento. Tenho medo de agredi-lo e acabar por traumatizá-lo. Por isso, doutor, trouxe-o aqui, conto com a sua ajuda, e rezo para que eu esteja completamente enganado.
- Tudo bem, disse o médico, o senhor fez a coisa certa procurando a ajuda de um profissional. Mande-o entrar. Eu me encarrego de conversar com ele.
- Mas antes, doutor, eu quero saber: Como é que o senhor pretende agir para esclarecer as minhas dúvidas?
- Farei ao seu filho quatro perguntas, somente. Dependendo das respostas dele, posso confirmar ou negar as suas suspeitas.
- Mas como assim, doutor, que perguntas serão essas, não pode me adiantar? Não quero traumatizar meu filho, lembre-se.
- Meu Senhor, relaxe! Aguarde na recepção e mande o garoto entrar. Eu cuido do resto. É a minha profissão.
Sai o pai e entra o filho na sala do médico.
O psicólogo ajuda o garoto a se deitar confortavelmente no divã e em seguida esclarece o que pretende dele:
- Filho, eu vou fazer-lhe quatro perguntinhas apenas e gostaria que você me respondesse a verdade. Sem pressa, com calma, mas a verdade. Tudo bem?
Com a aprovação do garoto, o psicólogo sentou-se ao lado do divã; segurando papel e caneta deu início aos trabalhos.
- Vamos então à primeira perguntinha, disse o psicólogo. Na matemática, qual o número que você mais admira?
- Na matemática! Bem, não sei,... O número onze, eu acho.
O adolescente respondeu cheio de incerteza.
- Número onze. Perfeito! disse o médico enquanto escrevia. Vamos à segunda perguntinha agora, ele continuou. Na natureza, qual o animal que você mais gosta ou que você simpatiza mais?
- Na natureza, um animal, um a-ni-mal. Ah!... O jacaré. Respondeu, mas sem a menor convicção.
- Muito bem, jacaré. Vamos à terceira pergunta, disse o médico, que continuava escrevendo enquanto falava. Nas suas refeições, qual a hortaliça que, quando tem na mesa, você mais gosta de comer e faz questão de ter sempre no seu prato?
- Caramba! Agora o senhor me pegou mesmo! Exclamou, muito confuso, o adolescente. Hortaliça, hortaliça... chuchu; é, eu gosto de chuchu.
- Chu-chu. O psicólogo repetiu a palavra com satisfação fazendo questão de separar uma sílaba da outra. Muito bem, filho, vamos à quarta e última perguntinha: O que você quer ser quando crescer? Ou melhor, qual a profissão que você deseja exercer quando tiver que trabalhar?
- Ah doutor, quando eu crescer quero ser advogado, respondeu com determinação.
- Ótimo, disse o psicólogo, com evidente satisfação. Tá terminada a consulta, filho. Espere na recepção e diga ao seu pai que ele pode entrar.
O pai, muito tenso e suando bastante, entrou no consultório ansioso em ouvir o que o médico tinha pra lhe dizer.
- Fala doutor, qual o resultado de tudo isso?
- Eu lamento muito, meu amigo, mas estão confirmadas todas as suas suspeitas.
- Como assim, doutor, me explica.
- Peço que o senhor se sente, por favor. No início, eu lhe antecipei, que faria apenas quatro perguntas ao seu filho e de acordo com as respostas dele eu esclareceria as suas dúvidas, certo?
- Sim, foi isso exatamente o que o senhor falou.
- Pois muito bem, minha primeira curiosidade era saber qual o número, na matemática, que o seu filho mais admira. E ele respondeu que é o número onze. Eu pergunto: O que é o número onze? O número onze nada mais é do que: Um, atrás do outro, certo? Enquanto falava o psicólogo roçava um no outro os dois dedos indicadores das mãos convencido de que aquele gesto ajudava ao pai entender o que ele "explicava". Temos aí a primeira confirmação. Depois eu perguntei com qual animal na natureza ele mais simpatiza, e ele respondeu que é com o jacaré. De novo eu pergunto: O jacaré se defende como? COM O RABO, não é verdade? Taí a segunda confirmação. A terceira curiosidade era saber qual a hortaliça que ele mais gosta de comer. Sabe o que foi que ele respondeu? CHUCHU. O senhor, com certeza, conhece o ditado: "Dá mais do que chuchu na serra". Temos com essa resposta a terceira confirmação. E pra finalizar, amigo, eu perguntei ao seu filho que profissão ele quer exercer quando tiver que trabalhar. E ele respondeu: ADVOGADO. Ora, todo mundo sabe que advogado entra em qualquer Vara, sendo assim...

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